segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Giba Giba, gigante negão

por Ediane Oliveira, jornalista

Mesmo em silêncio, na tarde quente de 3 de fevereiro de 2014, quando o sol nasceu após o dia de Iemanjá, Giba Giba tocou seu último sopapo na terra.
As mãos que tocam o som grave retumbam um adeus de eternidade a uma construção necessária e significativa na história negra do estado. Uma construção que não pode se calar e que muito foi levantada – e urgentemente entoada por mãos negras estendidas à voz e ao toque do sopapo. Pelotas é terra de Mestre Baptista, terra de Giba Giba, solo negro de dois fundamentais ícones na disseminação e popularização do tambor que traduz muito da identidade musical afro-gaúcha. Deixando saudades, reconhecimentos e emoções, o negro conhecido por suas vestes coloridas, sua vivacidade na música e seu toque que exprime gravidade e força, foi tocar seu sopapo junto aos seus ancestrais. Partiu, deixando sua marca de dedicação, devoção e luta à história que muitos tentam apagar. 
“Sua obra é viva nesse ‘Lugarejo’ e seus seguidores permanecerão batendo tambor para lembrar que o estado mais meridional do país, entendido por muitos como a “Europa do Brasil”, também é, inegavelmente, a ‘África do Brasil’”, declarou o músico e ativista cultural Richard Serraria, amigo pessoal de Giba e parceiro em projetos com o percussionista. Em corações, a saudade: “Ele nos deixa o legado de que o som não pode parar e que suas mãos ainda vão seguir tocando o som negro-gaúcho”, disse, emocionada, Natália Pereira, que conheceu o músico através de sua pesquisa na Universidade sobre a história do negro no RS.
Giba Giba foi uma das grandes inspirações do documentário O Grande Tambor, produzido pelo Coletivo Catarse. De acordo com idealizadores do projeto, ele foi a fonte inicial de pesquisa e o precursor da resistência de uma história que vem aos poucos vindo à tona, desde o início deste novo século, quando idealizou o Projeto CABOBU e conheceu aquele que viria a se tornar seu amigo, Mestre Baptista. Dali, dos primeiros 40 Sopapos construídos, o tambor vem em 15 anos retomando seu espaço devido na cultura brasileira e gaúcha e já não mais pode ser considerado em extinção.
Fica a sua história, sua contribuição, seu legado, seu toque resistente às mais diversas e estúpidas tentativas que buscaram calar o som incessante, contundente e necessário do sopapo. Como herança dos negros que construíram o estado  através do tenebroso e triste trabalho nas charqueadas, o instrumento hoje toca, buscando ainda mais a liberdade. A canção de Serraria “a palma da tua mão é branca, meu irmão, o canto do sopapo é negro, negão” percebe a magia do som afro que ainda ecoa: “Gigabytes de emoção… Giba Giba, gigante negão.”  Nossos mestres estão indo, mas deixam heranças. A história não para. E o som  precisa seguir com o grito genuinamente grave e sagrado, tocado por mãos negras e santas, como as de Giba Giba.

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